sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

crónicas de graça # 8

Pontualidade

Isto de se ser pontual, não será uma tarefa fácil de se cumprir. Porque pontualidade no verdadeiro sentido pouco se pratica. Na maior parte dos casos, ou se chega antes, ou depois.

Eu sou das que chegam antes da hora marcada. Não sei fazer doutra maneira. Nem quero. Mesmo que os outros façam o contrário. Até cinco minutos de atraso, não se passa nada, mas a partir daí começo a embaciar o vidro relógio com o fumo das narinas.
As justificações são sempre as mesmas: o trânsito, uma reunião que se estendeu, um telefonema de última hora, o médico que se atrasou, a fila do supermercado, a máquina da roupa que deu o berro. Como se a outra parte também não tivesse imprevistos.
Pode-se rapidamente fazer o perfil dos atrasado-compulsivos. São quase sempre pessoas descontraídas, flexíveis com o factor tempo, parecem a todo o tempo bem dispostas e têm por lema, a vida são dois dias e stress. Não esquecer, que chegam sempre com um enorme e irresistível sorriso de anjo na cara, acessório imprescindível à desculpa do atraso. E se ainda repararem bem, têm um letreiro na testa dizendo, eu tenho cá uma lata!
Adoptei há muitos anos, a estratégia de me encontrar com eles - esses amigos perfeitamente identificados - em esplanadas a apanhar sol, já sentadinha no restaurante a petiscar, ou em casa. Nunca na rua especada, feito estátua nervosa presa ao pedestal.
Os atrasados não sofrem muito com a questão e a coisa funciona até bem, mas só para o seu modo de ser.
Há o outro lado deles, que me aterroriza. Têm regularmente mil tarefas em mãos, as quais não conseguem cumprir, deixam muita coisa para trás e para depois, falham constantemente compromissos que vão desde uma importantíssima reunião de negócios, à festa da escola dos filhos. São incapazes de fazer escolhas entre um assunto que requeira prioridade, e outro supérfluo. Dizem que sim a tudo, nunca há impedimentos para nada, alguma coisa se há-de desenrascar. Aquela velha história, de que o ovo estará eternamente na galinha...
Ora, este é o oposto do comportamento dos adiantados. Organizados, metódicos, previdentes. Também temos o lado negro claro, não somos perfeitos: ansiosos, impacientes, apressados, exigentes.

Um dia, assisti a uma peça no Teatro Tivoli, "Sete Minutos", um monólogo com o brilhante António Fagundes. O actor avisou em entrevistas televisivas e reportagens, de que as portas encerravam impreterivelmente às 20.45h. Nem mais uma alminha lusa entrava naquela sala, nem sequer valiam a pena, as desculpas de maremotos, morte da mãe ou uma unha encravada. Nada, nada, nada.
O público português ria é claro, achavam graça, comentavam o impraticável atrevimento, não acreditavam na sua concretização. Dito e feito. Ficaram cinco ou seis pessoas na rua e o caso foi tão insólito neste país de atrasados, que até deu em notícia de jornal.

Infelizmente, a exequível ideia ficou-se por ali. Devia haver normas mais severas de cumprimento de horários, especialmente nos locais públicos, onde os demais são prejudicados pela classe dos atrasados crónicos. Cinema, teatro, concertos, conferências e afins.
Lá vêm eles, à média luz, sempre com aquele
enervante arzinho pateta, quase dócil, praticamente de gatas, a passarem entre as cadeiras aos tropeções e de nariz no chão, cheios de com licenças e desculpe, desculpe, desculpe, que só me apetece empurrá-los por ali abaixo (a privação de açucares deixa-me assim, colérica).
Pronto, já desabafei!



E o Carlos? Por favor não me dê um desgosto, dizendo que é um desses! Bom, desconfio que não.

Crónicas de Graça #1, #2, #3, #4, #5, #6, #7.

26 comentários:

Paula disse...

Aplaudo de pé! Também sofro como tu com esses atrasado! E olha... continua na privação do açucar pois este registo sabe bem e dá vontade de pedir mais!
Já agora, para além de mim própria, parece-me que a Dionísia e até a Tininha compartilham deste mesmo sofrimento com os atrasados!!
bjs e bom fim de semana

Pitanga Doce disse...

Eu até podia responder ao teu texto mas é que já estou atrasada meia hora para um compromisso.

beijinhos e volto mais tarde. hehehehehehe

Teresa Fidalgo disse...

Honro-me de fazer parte da classe, como a Patti, dos que chegam uns minutos antes da hora.

Mas não partilho consigo de que se é necessáriamente stessado. Eu, pessoalmente, não sou stressada. Chego a tempo e pronto, sem qualquer tipo de sacrifício. Se é preciso chegar a determinada hora, calcula-se o tempo de forma a que isso aconteça... Fico stressada, isso sim, se não consigo chegar a tempo! (O que, desde que tenho autonomia, não me lembro de ter acontecido).

Na minha área é comum os atrasos - Sou advogada, e como tal, assisto com frequência a atrasos e, pior ainda, à sua aceitação. É normal, dizem!
Uma única vez fiquei surpreendida: Num Tribunal da Comarca de Penafiel, aguardava eu, o meu cliente e nossas testemunhas (sim, porque esses chegam também sempre antes da hora - eu tenho o cuidado de os prevenir para o fazerem), pela chegada do meu colega, seus clientes e testemunhas. A funcionária fez a chamada às 9h00, como lhe competia. Voltou a repeti-la à 9h30, e as faltas mantinham-se. Após a 2ª chamada, o Juiz chamou-me à sala e disse-me: "A prova compete à outra parte, não há testemunhas, não há prova. Quer prescindir da sua prova que eu dito já a sentença?" Fiquei espantada, e ainda pensei interceder pelo meu colega. Mas logo o Juíz me disse: "Não vou esperar mais, horas são horas, vou dar por iniciado o julgamento, não há qualquer motivo para adiamento."
E assim foi. Ali, na hora, o Juiz ditou para a acta: "Julgo improcedente, por não provada, a presente acção."
Nem mais!
Os atrasados, quando chegaram, depararam-se com um julgamento feito!

CNS disse...

Já alguém pensou que a falta de pontualidade poderá ser uma compulsiva falta de respeito pelo tempo dos outros?

Em total sintonia consigo, Patti. Bom fim de semana.

anniehall disse...

CNS disse tudo .
Um bom fim de semana .

Luísa A. disse...

Pronto, Patti, já desabafou. Eu tenho alguns amigos desses, com os quais já não há marcações senão para jantares de grupo. Há uns anos, ainda combinava outras coisas. Mas, com os seus invariáveis – e insuportáveis - atrasos, aprendi a dar-lhes uma tolerância máxima de cinco minutos e a bater em retirada decorridos estes; e eles aprenderam a nunca mais combinar nada comigo. ;-D

paulofski disse...

Apesar de por vezes me descuidar e atrasar (imprevistos!) isso não me traz nenhum prazer especial. Incomoda-me chegar atrasado quando deixo pessoas à minha espera. Mas por outro lado se sabemos que a pessoa com quem nos vamos encontrar é do tipo “atrasado-mor”, mais vale tentar prever o atraso e atrasarmo-nos também para evitarmos uma grande seca. No teatro deveria ser como nas salas de cinema, onde quem chegar mais cedo apanha os melhores lugares mas também pode correr o risco de adormecer antes do inicio da secção!

1/4 de Fada disse...

Não deixa de ser curioso vir visitar-te e dar-te os parabéns precisamente num post sobre a pontualidade, pois não? Tenho-me mantido fiel a algumas leituras e não costumo perder as tuas (vossas) crónicas de sexta-feira, porque há hábitos difíceis de perder e paragens obrigatórias neste blogobairro. Tu, o Carlos, a Si e a Gi são vizinhos de que não me esqueço e que visito regularmente.
Beijinhos.

Patti disse...

Querida Fada:
Que saudades! Nem imaginas a falta que o teu blog e a tua presença nos nossos, tem feito a todos.
Que bom saber que vais fadando por aí.
Mil beijinhos. :)))))))))))

BlueVelvet disse...

Descreveste as categorias todas e muito bem.
Eu sou das adiantadas. Sempre.
Dizia a minha a vó que a pontualidade é apanágio dos reis.
Mas, de facto, quando se espera em casa ou numa esplanada, dá para aguentar. Agora aquela história dos espectáculos, essa põe-me doida. E eles fazem mesmo essa arzinho que descreves.
Também fui ao Fagundes e os nomes que chamaram ao homem, só visto. Estão mal habituados. No West End e na Broadway não há conversas. Não entram e pronto.
Eu perdi uma peça magnífica, Stardust Memories, em Londres, mas realmente não deu mesmo. Chovia em Londres que parecia o Rio de Janeiro e não havia hipótese de arranjar táxi. Para veres cheguei a meio do 2º acto. Claro que nem tentei entrar. Troquei os bilhetes para outro dia. Tive sorte.
Agora, vou ali ao Carlos, que ele não me oiça, mas acho que é dos atrasados não complusivos.
Bjs

São disse...

Eu já ouvi um estrangeiro dizendo que esta pecha dos atrasos é motivada por sermos um povo indisciplinado.

Bom fim de semana.

Carlota e a Turmalina disse...

Ah...estou sempre correndo, talvez pq eu goste de chegar antecipadamente à um encontro.E como conheço os atrasos alheios vou sempre preparada...
Bjos

Violeta disse...

Como disse no blogue do vizinho, o que mais detesto são as desculpas para justificar o atraso.
Por norma chego adiantada, mas confesso que já tenho chegado atrasada. Porém, procuro redimir-me. Sofri muito com um namorado que tive em tempos. Entre o tempo que me deixava a esperar, as desculpas porque chegou atrasado, o meu mau humor por o ter feito e a discussão que vinha sempre a seguir pouco sobrava para o amor.
Bom fim de semana.

estouparaaquivirada disse...

também convivo muito mal com os atrasos e os atrasados.
Tenho uma amiga que me leva ao desespero! Enquanto espero fico num crescendo de raiva...e juro que para a próxima deixo-a especada à minha espera.
Ainda não aconteceu, talvez porque entre uma combinação e a seguinte eu deixo passar tanto tempo a ver se me esqueço!
Mas detesto!
Adorei o post.

pedro oliveira disse...

sou daqueles que digo estou aí ás 20: 40 e com kms para fazer como foi na 2ª feira no jantar de blog vila forte, cheguei ás 20:40 como é evidente o último chegou ás 21:15.De manhã tenho tudo programado ao minuto,mas é como dizes sofremos muito.
tenho que hoje podemos serv poucos,mas manhã devemos e temos de ser mais,muito mais, é uma das GRANDES causas deste país não avançar.
bjs

Si disse...

Pronto, agora que a escandinava já chegou, já podem começar os comentários!!!

E ó FAAAAAAAAAAAAADAAAAAAAAAAAAA!!!

FADINHAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAAA!!

Que bom vê-la por aqui!!!!!!!!!!

Anónimo disse...

Curiosa esta coincidência de pontos de vista ( até a fotografia que escolhemos foi igual) sobre a pontualidade. E eu que tenho a mania que todas as mulheres são atrasadas! Vou fazer penitência,mas eu é que devo ter azar...

josé luís disse...

concordo consigo, respeito horários, respeito os outros.

apesar do irmão pessoa ricardo ter alguma razão quando afirma:

«Vive sem horas. Quanto mede pesa,
E quanto pensas mede.
Num fluido incerto nexo, como o rio
Cujas ondas são ele,
Assim teus dias vê, e se te vires
Passar, como a outrem, cala.»

lembro sempre o meu querido oscar wilde:

«Time is a waste of money»

e não o desperdiço...

Gi disse...

Eu sou das que chega antes de tempo, embora tenha cá em casa dois que saem de casa à hora em que deveriam estar no sítio, com a desculpa que assim não têm de esperar. Só me stresso quando tenho que ir com eles a reboque e tenho que os fazer sair a horas de não chegarem atrasados -o que lhes causa grande stress. :D

PS.: Fada, Fadita, obrigada pela menção honrosa e sempre a tempo. :)

Manuela Freitas disse...

Olá,
Do Carlos vim até aqui e estão bem sintonizados!...
Sobre os atrasos é uma lamentável desconsideração pelos pontuais!...Como o Fagundes e como fazem nos concertos, chegado à hora, ninguém mais devia entrar.Só assim a situação se alterava.
Bjs,
Manuela

Filoxera disse...

Também sou ansiosa, apressada e exigente, julgo que em excesso.
:-(
Beijos, sem pressa.

mike disse...

Com licença, com licença, desculpe, desculpe, por favor, com licença... atrasado, eu sei... só para dizer que gostei muito deste texto... com licença, desculpe. ;)

salvoconduto disse...

Já desabafaste? Que grande lata! Vens com o post 12 horas atrasada e ainda te pões aqui a arengar contra os atrasados! Eu estive cá à horinha, bati, bati e ninguém me abriu a porta. Nem sequer uma desculpa, mesmo daquelas esfarrapadas: "ai e tal, estive com a net em baixo..." Vai lá vai, já pareces o frei Tomás..

Bacouca disse...

Patti,
Eu acho que esses que se esmeram por se atrasar fazem-no com consciência pois acham que assim são notados. Mostra infelizmente a pressa com que se pos, neste país, a "carroça à frente dos bois".
Pedir desculpa num concerto, conferência, cinema? Eu nunca ouvi a fazerem-mo mas também devo confessar que nem sequer me mexo um milimetro para lhes facilitar a vida.
Beijo

Patti disse...

São e Manuela Freitas:
Sejam muito bem-vindas ao meu Ares :)

Tite disse...

Patti,

Eu estou contigo e não abro.
É verdade que nos chamam "stressadas" e outras coisas que tais. É verdade que corremos o risco de esperarmos horas pelos tais seres "felizes" que têm sempre um sorriso angelical para a má cara que lhes devolvemos sempre que se atrasam, mas... se este país tem que mudar alguém tem que dar o exemplo, n'é?