quarta-feira, 25 de março de 2009

dois amores

foto terillo

Já lá vão oito anos de dança e a convivência com o ritmo, que lhe vibra os movimentos em todos os instantes onde exista melodia.
Sendo cada vez mais evidente esta afeição pela dança, seguimos por uma escola séria: cinco anos intensos, logo para começar, programa de acordo com a RAD, método, rigor, trabalho sério. E quanto mais sério mais ela gosta, definindo-se logo um amor para a vida.
Mas a menina revelou ambivalência nas paixões e mal as delicadas sapatilhas de pele lhe deslizam e se soltam do pé, este vai até ao fundo de um cano alto de cabedal, rude e másculo, onde brilha uma espora prateada que o remata no final.
O pompom perfeito, enrolado pacientemente numa rede fina, quase tecida por dotadas aranhas, é desfeito sem dó e da cabeça,
assustados com o repentino do gesto, soltam-se mil ganchos, antes sabiamente dissimulados entre as melenas.
De imediato, o cabelo comprido é negligentemente apanhado com o primeiro elástico que surgir à mão, num insípido rabo-de-cavalo e toda a cabeça se protege e esconde sob um salvador e clássico toque de veludo.
As linhas elegantes do jovem corpo, que no espaço de dois ou três anos serão chamadas de curvilíneas, não se perdem entre a passagem do maillot para as estreitas calças de montar, vulgo breeches.
Agora, o som dos cascos da égua Nur, substitui com nobreza rural, a anterior melodia cortesã das leves teclas do piano afagadas por Miss Caroline e a imensurável força do corpo, que era obrigatoriamente ocultada, no rigor de movimentos falsamente leves e subtis como plumas, é neste momento brutalmente evidente na pujança de uma cedência à perna, que se quer executada na perfeição que um Lusitano merece, sob o comando de uma voz austera inspiradora na confiança e no saber.
Já não se ouve Mozart, Chopin ou jazz, mas sim a dor do fado e o orgulhoso flamenco.
E assim se passam anos, onde comungam em harmonia splits, hops, amalgamations, kicks e tendus por entre trabalhos em encurvação, mudanças de mão, trotes médios, encostos à rédea de fora, cabeças ao muro, passos largos e galopes contra o vento.

24 comentários:

Gi disse...

Ainda hei-de ver essa bela protagonista protagonizar um bailado equestre.

Patti disse...

Gi:
E a esse bailado chama-se na equitação de Dressage. É o que ela pratica e mais adora.

CPrice disse...

Iam certamente dar-se bem as nossas "clássicas amazonas" :)

Um beijinho à Beatriz que a inspira desta forma tão descritiva Patti :)

Patti disse...

Once:
Aposto que sim.
Obrigada.

mjf disse...

Olá!
Lindo post...e linda homenagem á Beatriz :=)

Beijocas

nocas verde disse...

eu, mãe de homens, delicio-me com a bela amazona com asas de terpsicore
iam dar-se bem esta e a da cházinha, de certo :)
(os meus xy ficam de guarda, ok?)

Pitanga Doce disse...

Patti, que linda esta tua definição das duas "danças"! Deve ter gosto refinado e ouvido atento a bela protagonista da história.
Então estou certa quando digo que nesse mundo de maus modos e terrível qualidade de sons ainda há lugar para o que é delicado e gentil, para o que flutua no ar ou marca compasso no chão, mas tudo com delicadeza e elegância.
Sutileza, querida Patti. O mundo precisa de sutileza. Os tais "movimentos delicados" que um dia descrevi.

Tenho saudades da primeira dança que outra personagem fazia mas teve que deixar por não conseguir conciliar com os estudos.

beijos de bom dia

BlueVelvet disse...

Mais do que dois amores, serão duas paixões.
E como paixões que são, não são fáceis, sobretudo neste País.
Admiro-a a ela por essa tenacidade e ambivalência, mas admiro-te mais ainda a ti, por incentivares o percorrer desse caminho que inexoravelmente a afastará de ti.
Um dia, quem sabe, ainda a aplaudimos no Cirque du Soleil...
Beijinhos às duas

R.Rosmaninho disse...

Que sorte tem essa menina em poder, naturalmente, perceber como é possivel e tão bom não termos que compartimentar os nossos gostos, paixões (e mais tarde, se calhar, opiniões). O sentido de abrangência, tão importante para poder ser realmente livre e feliz.

Bacouca disse...

Julgo que é sempre importante as meninas, quando querem e podem, aprender ballet.Dá-lhes elegância e leveza no andar. E ainda por cima ouvem boa música!
Depois ou continuam a partir dos 14 ou mudam. Vejo que a Beatriz resolveu mudar.Cavalo e cavaleira, formando um só todo, é lindo de se ver! Ainda poderemos ter uma bela representação num qualquer concurso hípico. Avise quando acontecer.

paulofski disse...

Lindas estas palavras, que com uma elegância e beleza nos faz imaginar dois seres num bailado harmonioso e perfeito.

Si disse...

Não são dois, são três amores.
Dois, pelas danças, a pé e a cavalo, outro pelos pais, que lhe alimentam a paixão e incentivam a alma, que crescerá sensível, disciplinada e com um carácter bem moldado, 3 pontos em comum entre as duas actividades e indispensáveis para bem executar um 'pas de deux' a galope pela vida fora....

Patti disse...

Bacouca:
Não, a Beatriz não mudou, tal seria impensável. Ela conjuga as duas na perfeição. Uma, não lhe substituí a outra.

maria inês disse...

A avaliar pelo "pas de deux" não tenho a menor dúvida! Não me tenho lembrado de vos visitar e tão perto que tenho andado!

Anónimo disse...

E quando a leveza da dança se cruza com a elegância da Nur, e a clareza das palavras retrata tudo tão bem, podemos dizer que estamos perante um quadro perfeito!

Bjs para a Beatriz

Filoxera disse...

Antevejo aqui uma vocação. Se a Beatriz puder dedicar-se ao que mais adora, fico feliz por ela.
Beijos, a ambas.

Bacouca disse...

Patti,
Que bom! Conjugar as duas é uma verdadeira arte pois consegue passar da insustentável leveza para a sustentável solidez! Já agora que idade tem a Beatriz?
Um beijo

Anónimo disse...

...e com a sorte da mae a apoiar!!!
bjos

Violeta disse...

Bonito post, Patti. Bonito e ternurento... os animais são divinais
Patti venho agradecer a tua acção ao denunciares o caso dos cães. Ele é bem real e continua.
A minha ideia era que mais gent eo fizesse, am sinfelizmente as pessoas revoltam-se mas não conseguem passar à acção.
Obrigada e um feliz dia
Ando sem tempo para blogar.
bjs

Precis Almana disse...

Texto lindíssimo, como sempre.
Um dos livros da Santa Montefiore é sobre uma rapariga que "joga" (?) pólo na Argentina, sendo os cavalos portanto uma referência importante na vida dela.

maria inês disse...

e pronto, passei-me! Dois comentários no mesmo post! Agora é que foi! eheheheh

De dentro pra fora disse...

Só podias estar a falar da tua princesinha não é??(lembrei-me agora daquela prenda de natal que ela recebeu)...os nossos filhos são sem dúvida os nossos bens mais preciosos :)
Beijinhos ás duas

cristina ribeiro disse...

Andar a cavalo...coisa belíssima, e diz quem o conhece que é um animal de excepção, um amor para a vida...

f@ disse...

Patti... parabéns...
Aqui nem sei o que comentar...pela beleza do teu texto e dos laços que encerra...
que a Bea seja tudo o que gosta...

beijinhos ás duas