Comprei noutro dia num alfarrabista de Lisboa, este livro antigo e maravilhoso de cartas para namorados, arranjar marido e arranjar esposa, tal e qual como consta do sub título no interior. São dezenas delas com respostas e negações das pretendidas aos seus candidatos. Escolhi uma que achei uma delícia, desde as palavras respeitosas do rapaz, à envergonhada resposta dela e terminando na carta em que ele pede aos pais dela, para que estes os autorizem a conversar.
São cartas de outros tempos que me deixaram perdida de riso e ao mesmo tempo admirada e sensibilizada com este tipo de linguagem.
Carta do pretendente:
Exma. Sra.
Apesar de a conhecer há muito tempo, só hoje me atrevi a escrever-lhe.
Vivia amando-a em silencia, e sempre temi dirigir-lhe a menor frase de amor. Acanhamento meu, fruto da sua mesma timidez e do meu enorme respeito.
Agora não posso mais calar este afecto que me domina e que é razão de ser da minha própria vida.
Não me dê uma resposta negativa. Pense bem, muito antes de me escrever, mas conceda-me a graça de esperar o seu afecto, mesmo que eu tenha de lhe demonstrar, à força de sacrifícios, que ninguém mais a amará como eu a amo.
Espero cheio de temor e ansiedade a sua carta
Francisco
Resposta da menina:
Exmo. Sr.
Após ter mostrado a meus pais a carta que V. Exa. me escreveu, e animada pelos seus conselhos e porque também eu o estimo com bastante sinceridade, venho assim tranquilizar o seu coração alvoraçado.
Meus pais conhecem-no um pouco e isso é uma garantia para o nosso amor.
Ser-me-ia doloroso simpatizar com alguém a quem os meus olhassem com maus olhos. Felizmente dá-se o contrário e isso é uma grande felicidade para nós.
Veremos se não terei de me arrepender pela facilidade com que acreditei nas suas boas expressões.
Sem mais, creia-me com toda a consideração.
Madalena
Pedido de namoro aos pais:
Exmos. Srs.
Há tempo já, que estou para me dirigir pessoalmente a V. Exas. Uma timidez grande me tem embaraçado. Vencida hoje, em parte, essa timidez, resolvi escrever a V. Exas., pedindo-lhes que me concedam a suprema ventura de falar com a filha de V. Exas.
Repugna à lealdade do meu carácter amá-la e falar-lhe, sem que os pais o saibam.
V. Exas. Dirão o que se lhes oferecer sobre o assunto, uma vez tomadas as informações que julguem necessárias a meu respeito.
De V. Exas, At.e Ven. e Obgº
Francisco
Isto não é incrível?
32 comentários:
Ganda nóia! Lembro-me de nos meus tempos de liceu termos lido, na turma de português,um livro semelhante, seria o mesmo?
Lembro-me de uma carta que começava assim:
"Talvez tome por ousadia o eu dirigir-lhe esta carta, mas creia que se o faço é impulsionado por um dos mais nobres sentimentos, o Amor... e continuava num estilo parecido com o desta.
Hehe, saíste-te bem do desafio da Vera.
Devia ser muito engraçado receber estas cartas.
O coração das donzelas devia bater forte.
Outros tempos.
Não digo que ainda devia ser assim, mas que tenho suadades de escrever cartas em vez de mails, tenho.
Patti,
coisas de outros (tempos) lol
isto hoje é tudo rápido , tipo as pipocas de micro-ondas :-)
jito,
sony
O formalismo destas cartas deve ter-se inspirado - ou terá sido ele a inspirar? – o estilo da melhor correspondência comercial, Patti. É muito divertido e dá bem conta de como o Amor devia ser complicado há umas décadas, e uma aposta cega, fundada em distantes contemplações, em furtivas trocas de olhares e nas referências colhidas pelos pais... Adivinha-se, é certo, que nas cartas seguintes as palavras aquecessem, mas fariam mais luz? ;-D
é horrível...
(acho eu)
Aposto como estas cartas, um dia, estiveram atadas com laços de fitas! E perfumadas!
boa noite Patti.
Incrível mesmo e fica-me uma pergunta: Seriam essas pessoas mais felizes do que nós hoje em dia?
Cartas de amor, quem as não teve...
As minhas são todas em alemão (para mim) e em inglês (para ele) .. .teria que lhe pedir as minhas.
Mas tenho uns bilhetes e uns emails jeitosos trocados com Mr.Darcy;)
Este post deu-me uma ideia para um que vou publicar no meu blog, tambem eu recebi uma carta de amor quando tinhas cerca de 15 anos,que deu origem a muita risada e embaraco.
Beijinho.
Era giro mostrar essas cartas hoje aos garinos e ver a reação deles.
Na era do já está, estas cartas devem fazer-lhe alguma confusão.
Basta ver os jornais hoje em relação á idade em que eles e elas começam a ter relações sexuais.
Impensável na altura desse livro.
adorei as cartas. lembrei-me logo dos livros de Jane Austen
Está mais que bom Patti!
Adoro ler estas cartas de outros tempos. Não sei se já viste, mas nas últimas páginas da revista Tabu, do jornal Sol, também são publicada Cartas de Amor entre figuras célebres da História Mundial. Acho-as deliciosas. Era tudo tão cerimonioso, tão cheio de delicadeza, tão impregnado de desejo tão bem dissimulado!
Sabes, eu nunca recebi uma carta de Amor...não é incrível? E, no entanto, escrevi e continuo a escrever tantas...
Um beijo do tamanho de uma enorme carta de Amor!
É engraçado sim senhor.
E o mais engraçado é que eu por acaso também cheguei a começar um namoro precisamente por carta, com uma “marafada” algarvia que uma ocasião conheci em Faro, já lá vão vinte e tal anos. A sua beleza era tal, e a popularidade tão grande, que sempre julguei que jamais teria alguma chance. De regresso a Lisboa, com os 300 kms de distância como incentivo, resolvi declarar-me com uma carta desse género, não tão formal, mais ao meu estilo, com algum humor à mistura.
Valeu-me um ano de namoro aos fins-de-semana e férias, e uma quantidade infindável de viagens de combpoio.
Só mais uma coisa também engraçada. Ela tinha 17 anos, nunca tinha namorado, julgava até que devia ter algum problema pois os rapazes não queriam nada com ela. Era uma altura onde as raparigas não tinham por hábito pedir namoro aos rapazes, e pelos vistos a malta, tal como eu, julgava não ter chance. O problema dela era beleza a mais, e esta sempre mania que o homem tem de complicar a sua própria vida.
Na carta do Francisco salta-me à vista uma frase, que essa sim achi incrível: «Não me dê uma resposta negativa», do género, estou muito apaixonado, sou muito respeitador, e tenho muito boas intenções, mas se me dás uma nega não sei o pode acontecer, eheheh..
Enfim outros tempos
:)
beijocas
que coisa fofa! oohhhh, coisinha delicada, cuidadosa, com respeito... eu li essas coisas tbm Patti :)
sabe do que lembrei agora? dos livros de amor do Khalil Gibran, adorava o seu jeito apaixonado de viver.
"quando o amor acenar, siga-o ainda que por caminhos ásperos e íngremes".
Bom fim de semana com mt amor pra vcs
Pensarao os adolescentos de agora: Isto existiu alguma vez??? Que horror!!!
Hoje em dia tudo vai a uma velocidade...entre o que li no teu post e o que se passa hoje nao existiu " meio termo ".Mas é sempre bonito ler essas cartas ( nao é que eles nao fizessem o " mesmo " que nós ( ahaha) mas a conquista era mais dificil! ou será que nao somos netos dessa geraçao? e se calhar com muitos irmaos...ou seja, nao havia televisao!
bjos e bom fim de semana.
eu também quero! lembrei-me de te deixar:
Poema
"Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.
Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.
Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.
Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.
A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.
(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas)."
Álvaro de Campos
Bom fim de semana
Salvo:
Se não é este, seria um muito parecido.
Blue Velvet:
Só corações palpitantes.
Sony:
Há bués, como se diz agora.
Luísa:
Tudo demasiado formal sim. Os sentimentos até poderiam ser verdadeiros, mas eram completos tiros no escuro. O que eu me ri com as respostas negativas das meninas e eles tristíssimos a dizer quase que se iam matar. Lindo, lindo!
Alecrim:
Horrível a distância das pessoas. Mas é tão engraçado ver como as coisas eram. Mas também prefiro esta época, com todos os seus exageros.
Pitanga:
De certezinha absoluta. E ainda devem haver por aí muitas, perdidas em gavetas, arcas e baús.
Paulo:
É provável, porque a definição de felicidade era muito mais simples e contida.
Gi:
Só tive uma e chegou-me.
Miepeee:
Vou lá espreitar depois.
Pedro:
Foi o que eu fiz. Estava com a Beatriz quando comprei o livro e ela: oh mãe, traduz!
Teresa:
Jane Austen era mais verdadeira e emocional. Aqui parece-me tudo um pouco elaborado e rebuscado. Mas tem parecenças.
Vera:
Ainda bem que gostaste. És uma romântica, rapariga.
Jotabê:
Gira a tua história e também sei de muitas assim de amigos meus. Poucas resultaram em algo de mais concreto.
E havias de ler as cartas deles, quando elas rejeitavam a aproximação. Autênticos Camilos e Bocages de corações abandonados e destroçados.
Nina:
Você uma romântica, só tinha mesmo de gostar destas cartas. E que tal o tempo na Alemanha?
Cláudia:
A Beatriz ficou a olhar espantada e eu também. É tudo demasiado rápido e se calhar estas cartas não têm tanto tempo assim. Talvez da altura dos nossos avós.
Inês:
Não há como Pessoa para dizer o que pensamos, de uma forma tudo menos ridícula, não é?
É pois Patti.
E mais te digo. Contado pela minha mãe, nos tempos em que as raparigas se tornavam maiores de idade, recebiam cartas de pretendentes que não conheciam nem ouviram falar. Os rapazes solteiros ficavam conhecedores que uma rapariga era namoradeira, ainda não tinha namorado, e assim enviavam-lhe cartas respeitosas de apresentação, algumas até com fotografias.
Eles já se conheciam. Corresponderam-se por vários anos. O amor dos meus pais cresceu com essas cartas e eu estou aqui.
Delicioso!
Hoje, tal coisa seria mais do género:
"kr tcl cmg? xamo.m gatanocio132 i kro 1 gj p curt nu próx fds lol. tlm 92123456"
Que nervossssss!
Este livrinho deve ter sido o pioneiro dos "consultórios sentimentais" das Marias, Crónicas Femininas e similares.
Li sempre com um sorriso nos lábios. Eu também escrevi cartas de amor e sempre tive a sensação de que "todas as cartas de amor são ridículas". Mas, pegando no comentário da Si, talvez fosse melhor do que receber declarações de amor por SMS!
PS: Já lancei o desafio lá no Rocedo, fico à espoera de contributos.
Fiquei deliciada!
Eu sei que é chocante para muitos, mas antigamente cabia ao pai inteirar-se da situação económica e moral do pretendente á mão da filha, de modo a saber se este tinha condições ou não para a sustentar.
Genial...
Sabes que mais? A minha tia tem postais de namoro dos meus avós pendurados na parede da sala. São amores-perfeitos emoldurados.
Patti, tens toda a razão no teu comentário. Há por aí uma caixinha cheia delas. Não devem ter tantos "efes" e erres" como estas, mas há.
"Quem não tem guardadas cartas de amor ainda com perfume de rosas... e atadas com lacinho...." vamos procurar e fazer um post?
beijinhos das nuvens
são no minimo estranhas, Patti...
mas retratam uma realidade, um tempo onde existiram todas essas formalidades.
Que delícia estas cartas!!!
Se por um lado nos dão vontade de rir, por outro fazem-nos pensar no quando os nossos antepassados penavam para namorar, chegando muitas vezesa casar sem verdadeiramente se conhecerem.
Agora é tudo mais rápido, mais tecnológico!!!
O livro deve ser todo ele um achado :)
Tão diferente das que Gertrudes Costa Lobo escreveu a Camilo Castelo Branco, de um amor desesperado.
eu sei que não sou do tempo das cartas de amor... a minha geraçao foi invadida por sms e emails... mas é delicioso ler cartas como as que apresentou neste post. é engraçado ver como as relações mudam com o tempo. as voltas que se tinham de dar para se poder dizer que se gostava de alguém:)
Antigamente havia muita formalidade. A minha sogra para poder ir ter com o meu sogro a África teve de casar cá na metrópole por procuração, pois não podis ir solteira!
Mas também havia muita coisa escondida e muitas meninas casavam depois de namorar da janela mas o primeiro filho nascia ao fim de 7 meses gorrdo...;-))))
Paulo:
Quer história maravilhosa essa, que a tua mãe conta. Tens de lhe arranjar este livro, que ela deve adorar.
Si:
Ai Si, olhe que tive mais dificuldade em compreender a sua.
Carlos:
Só são ridículas para quem as vê de fora. Ah um dia tem de publicar uma lá no Rochedo.
Pepper:
E fazia o pai muito bem. Hoje tem de saber se o noivo tem 'guito' para pagar a hipoteca ao banco, o carro e a mensalidade do infantário.
Filoxera:
Que espectáculo! Tens de fotografar e fazer um post.
Pitanga:
E tu tens essa caixinha, aposto.
F@:
Eu fiz este, agora sigam vocês com outros.
Luís:
Estranhas para nós, da mesma maneira que achamos estranho a maneira como os miúdos escrevem no msn, hoje em dia.
Realidades.
Lena:
Era tudo muito rebuscado e demasiado formal. Mas que são o máximo, ai isso são!
Cristina:
O livro é maravilhoso. E tem algumas bem camilianas, que são as que eles escrevem quando são rejeitados.
Susana:
Eu também não sou deste tempo, mas das cartas de amor deveríamos ser sempre, não é? Tu aliás, escreves muitas.
Reflexos:
É verdade, tudo formal demais. Também sei de muitas dessas trocas de cartas e de casamentos por procuração.
:)
meu pai, na "tropa" escreveu muitas cartas por outros, conta estórias deliciosas acerca...
à pergunta, "mas, rapaz, que queres que escreva?"
a resposta, "oh! Dias, prante-lhe o vocemecê entender, escreve tão lindo! e, olhe, ela também não sabe ler as linhas, vai ter que pedir pra lhas lerem"
era certo e sabido, algumas dessas cartas deram casamentos!
bom fim-de-semana e melhor semana
um sorriso :)
mariam
... e onde é o alfarrabista? Chiado? é um gosto andar por aí...
Fantastico, vir aqui hoje, soube mesmo bem, adorei...
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