sexta-feira, 5 de setembro de 2008

no meu ninho


Às 22.38 de ontem, recebo um sms a dizer o seguinte e passo a transcrever na íntegra: ”As meninas estão a ver a tourada. Depois irão dormir. Fiquem tranquilos. Boa noite!”.
A Beatriz foi dormir a casa de uma grande amiga, a Catarina e volta hoje ao fim do dia.

Já muitos de você sabem da paixão dela por cavalos, pela Dressage, pela Alta Escola, por limpar estábulos, acartar com bostas em palha seca, dar-lhes duche e escová-los, alimentá-los e se possível dormir a cheirar a cavalo. E também não é segredo, que o futuro dela, passará de certeza por eles, se não terminar mesmo ali.
Fora os cavalos, é uma apaixonada por todos os animais. Ama-os intuitivamente como eu, sem qualquer tipo de receio, seja cão, gato, coelho, formiga, borboleta, galinha, caracol ou formiga. É um amor inato e também promovido por mim. Isto é a mais pura das verdades. Nós não matamos uma formiga, uma aranha, uma lagartixa. Pegamos nelas e vamos pô-las na varanda ou nos vasos das plantas. Chamem-me maluca. Se existe dedicação pura e sem qualquer interesse é o amor ilimitado de um animal pelo seu dono. Mesmo que este, seja mais animal que ele e não o mereça. É um privilégio sermos amados por eles. Na minha família sempre o fomos e continuamos a ser. Sei por experiência própria, que a dor da sua morte não passa. Várias vezes o senti e ainda não me refiz da última.
E cheguei ao ponto de rebuçado deste post, do direito que lhe assiste à escolha e à sua própria opinião.
Não tenho de abrir a boca para nada. Só penso. Como é possível que ela adore tourada? Ela que é total e incondicionalmente apaixonada por todos os bichos! Ela, que se repara num animal na rua abandonado, chora e fica desconcertada, tal como eu com a idade dela e às vezes ainda hoje o faço. A resposta deve estar, atenção deve, porque também não sei explicar de outra forma, em alguma coisa que ela atinge e alcança para além do sofrimento do touro. É algo intrínseco à vida de quem lida com cavalos, de quem os cria, de quem trabalha com eles, de quem os domina, de quem os treina e educa. Chama-se paixão e sempre ouvi dizer que a paixão cega.
Quando na minha casa isto acontece, e estando eu a falar da minha própria filha da qual conheço os valores e os amores como ninguém, pela primeira vez consigo entender, mas não concordar, com algumas das razões dadas pelos aficionados da festa brava. Nós vemos uma parte e eles a outra.
Muito se fala das touradas serem proibidas ou não, que é um atentado aos direitos do touro e do cavalo, uma selvajaria medieval etc. Não é disso que quero falar, apesar de ser muito tentador. A tourada aqui, serviu só como um exemplo.
Exemplo para ilustrar o momento exacto em que os filhos nos ‘fogem’.
Escapam-nos como fumo, numa determinada situação que tínhamos como certa, num simples pormenor, quando estamos menos atentos. Eles crescem independentemente da idade e pensam por eles, tomam decisões diferentes daquelas que nós lhes ensinámos, explicámos e incutimos.
Sobem para o patamar seguinte, inerente à evolução do ser humano como livre pensador. É a consciência per si. Que a cada um pertence e a mais ninguém concerne
A maior prova de amor é deixá-la Ser.

Seguir, estar, produzir, calcular, existir, pensar, intuir, decidir, inventar, cair e levantar.
Deixá-la partir.
Errar e acertar.
Ainda não estou preparada para isto.
Nem nunca vou estar.
ADENDA: (09.35h)
Este post não é sobre touradas, só se refere a elas!

25 comentários:

LeniB disse...

Focas vários aspectos neste texto que me deram que pensar: primeiro, o amor que a minha sobrinha tem por todos os animais, que lhe é inato e, por outro lado, transmitido por ti. Por outro lado,o amor que muitos animais têm aos seus donos ser incondicionalmente maior do que o de muitas pessoas...
Depois, tal como tu, não gosto mesmo nada de touradas. Não gosto. Fico incomodada de ver farpas a serem espetadas nos touros, os cavalos esbaforidos, enfim...Talvez por isso não consiga ver o alcance da visão da Beatriz!
Por fim, a tomada de consciência de que os filhos não são propriedade nossa, que são seres que apenas temos de "preparar" para seguirem, da melhor maneira, o seu próprio rumo.
A tua sobrinha já está a seguir o dela...é incrível como uma simples mudança de escola nos pode abalar os alicerces!!

Patti disse...

Lena:
E o que estará para vir?
Bom de certeza absoluta! Não alcanço outra hipótese.

Anónimo disse...

Talvez um dia venha a odiar as touradas, quando se embrenhar na tourada da vida, sem a asa potectora da mãe, e da tia já agora.

BlueVelvet disse...

Este post tem várias partes, e para algumas, como sabes, não sou a melhor pessoa para falar do assunto
Mas enfim:
Quanto ao amor pelos animais, incondicional, eu sou assim, os meus filhos são assim. Tive um cãozinho 13 anos, lutei como uma leoa para o salvar ( aquando do 1º aviso de problemas renais, transformei-o em vegetariano e viveu mais 5 anos). O último mês de vida passei-o ao seu lado de dia e de noite e foi a decisão mais difícil da minha vida, até hoje, deixá-lo partir. Tive uma depressão após o seu desaparecimento que ainda não está debelada.
No entanto, houve uma altura da minha vida em que estive muito ligada ao meio dos toiros, e aquilo é de facto, um mundo estranho. As coisas vivem-se e sentem-se de outra forma. Não te sei explicar, nem aqui é o local, porque isto é um comentário e não um post meu.
Mas percebo a Beatriz.E percebo que o amor dela pelos animais não seja tão antagónico com o gosto pelas touradas.
Já quanto à obrigação de deixar os filhos voar...nunca disse o contrário. Escusavam era de ir fazer o ninho do outro lado do mundo. Afinal somos o quê? Uma máquina de procriar para que a população não envelheça? Eu não sou. Não quero ser. E não quero passar o resto da minha vida a não assistir aos aniversários do meu filho, às doenças, às alegrias. E um dia que venham netos?
Com te disse. Sou péssima para falar disto.
Talvez tu, que pareces ser uma mulher muito forte te consigas habituar.
Talvez!
Beijinhos vizinha

Gi disse...

A minha cunhada, irmã de Mr. Darcy, de todas as pessoas que conheço, para mim é a melhor pessoas do Mundo, um Anjo de altruísmo, de amor pelos outros, de amor pelos animais, de amor pelas flores, de amor pela Natureza e verdadeira aficionada das Touradas.

Anónimo disse...

Sou incapaz de ver uma tourada apesar de na minha familia os meus pais gostarem muito,O meu pai diz que fica maravilhado com a perfeição do cavaleiro e do cavalo como fossem um único só.Provavelmente a sua filha pensará o mesmo e daí gostar de touradas.
Por outro lado tenho um sobrinho com 4 anos que ama todos os bichos, digo ama porque é uma perdição ver aquele rapaz de volta de tudo quanto possam imaginar que exite numa aldeia de provincia, e o rapaz quer ser veterinário(aos 3 anos já disse ao pai, logo que percebeu que havia essa profissão quando levou o cão ao veterinário a primeira vez), também porque quer cuidar dos touros depois dos "doi doi" que os senhores lhes fazem.

Só para terminar, há cerca de 10 anos, numa viagem nacional de pessoas ligadas a uma marca de automoveis, a Espanha, tivemos de escolher um de dois programas: um Real MadridxCorunha ou uma tourada em "las ventas". A democracia é o que é e lá tivemos que ir á tourada, o bilhete foi uma fortuna,sei que era o melhor lugar da praça, mas só consegui estar lá dentro 5 minutos, quano vi o cavaleiro a espetar a lança no touro levantei-me e fui embora, fui beber umas "canhas" e umas tapas!

Patti disse...

Este post, refere só a tourada. Não é sobre ela. Já previa os comentários.

O texto trata de deixar os filhos, por muito pequenos que sejam, pensar e decidir pela própria cabeça. Respeitá-los nas suas decisões, mesmo que estejamos 100% contra elas.

Anónimo disse...

Patti,

Há realmente coisas inexplicáveis. Tenho um exemplo desses em casa.

Bom eu gosto de ver a tourada pelas várias "artes" envolvidas. Penso contudo que, com a evolução, as farpas podiam ter ventosas na ponta. O sacrifício do touro numa tourada à portuguesa, porque à espanhola recuso-me a ver, ao ser espetado leva-me a não acompanhar os espectáculos, aderindo apenas às "pegas".

Mas a minha filha mais nova, com 13 anos, amante e defensora dos animais, ao ponto de, desde pequenina dizer que quer ser veterinária (a ver vamos), e de ter um cão que trata como se de uma pessoa se tratasse, é "doente" po touradas!..

Não só não compreendo isso, como ainda ouço os comentários dela durante uma "corrida", fazendo referências técnicas a vários aspectos, tão precisos, que no inicio ria-me e gozava com ela. Contudo, segundos depois o comentador da televisão, dizia exactamente o que ela tinha dito!...

Agora pergunto, como é que uma pessoa, tão pequena, que nunca ouviu em casa ou na rua, penso eu, nada referente a touradas, consegue fazer comentários tão assertivos?...

Será a "sensibilidade" inata por gostar tanto daquele espectáculo?... (é que não me parece que tenha adquirido conhecimentos em lado nenhum!...)

Tretices por aqui

Vera disse...

Olá Patti!

Eu adoro touradas! Desde pequena que me lembro de as ver na televisão, a preto e branco, sentada no chão da sala dos meus Avós, sempre encostada às pernas da minha Avó (que saudades...).

Mas este post é sempre filhos com asas. Não é fácil, é duro, é ... não sei o quê...

O meu MM1 tem 14 anos e está habituado a voar, mas cada vez voa mais e cada vez me dói mais assistir ao vôo. Por um lado orgulho-me em silêncio pela responsabilidade com que o faz, mas por outro custa-me tanto...

E ainda tenho mais três para voar...as minhas rugas não existem por acaso...

Beijos querida Patti :-)

Anónimo disse...

Pois é Patti, dificil é conseguir que pensem como queremos, mas realmente o mais saudavel é que a personalidade delas a criem elas mesmas. O exemplo que deste de que a Beatriz AMA os animais e no entanto adora tourada talvez te saiba explicar ela melhor que ninguém...e de certeza que tem uma explicaçao coerente!

bjos e bom fim de semana ( por acaso DETESTO tourada )

Anónimo disse...

Patti: como a falta de experiência não me permite falar sobre a educação dos filhos, deixe-me só falar um bocadinho de animais.
Adoro tudo quanto seja bicho ( excepto baratas). A casa dos meus avós parecia um jardim zoológico, na dos meus pais só cães, peixes, coelhos, cágados e umas avezitas. Eu tinha um pastor alemão ( chamado VARIG!) que avisava sempre os meus pais quando eu estava a chegar de fim de semana. Ainda mal entrara no Porto, ele começava a ladrar e punha-se aos saltos, meio histérico, a correr pelo jardim de lá de casa.
Tenho imensa pena, por agora não poder ter ( recuso-me a enjaular animais emm andares).
Quanto a touradas, sem ser fundamentalista, detesto, mas compreendo que quem tem o amor da sua filha a cavalos, aprecie. É o tal lado B de todas as histórias que temos de compreender e aceitar.
PS: Logo, não se esqueça do guarda-chuva e vá bem agasalhada, porque o Inverno já chegou ao Norte!
Bom fds

Rita disse...

Sabes, lá em casa eu e as Rs também somos assim, não matamos nenhum bichinho e olha que há alguns de que eu não gosto mesmo nada mas às vezes faços das tripas coração para o expulsar sem ter que lhe pôr um chinelo em cima. Elas adoram formiguinhas, adoram caracóis, adoram as lagartas da couve (quando apanho alguma é uma festa) e se aparece lá algum ser pequeno desses, temos que o levar para a rua numa folhinha de couve para ele depois ter comida.
Eu sei que daqui a algum tempo (não tanto quanto eu desejaria) também elas me fugirão, seguindo a ordem natural da coisas e se por um lado isso é capaz de me deixar feliz, por as ver dar os seus passos com as suas próprias pernas por outro sinto que vai ser muito doloroso ver as minhas "pitchuquinhas" sairem debaixo da minha asa, voarem sozinhas.
Não consigo continur porque chorar no office é chato...
Jokas

Filoxera disse...

Pois! O meu filho também gosta de touradas... nem tudo "sai" como gostaríamos.
Só podemos demonstrar-lhes o que sentimos e aceitar o que eles sentem.
Beijos.

margarida já muito desfolhada disse...

por sugestão no blog da gasolina, "a árvore das palavras", vim cá.

gostei do que li por aqui a baixo.

sempre que possível volto.

cecília disse...

Ai, Patti, no que foi falar....

É tão difícil saber deixar os nossos filhos crescer, sentir que, cada dia que passa, está mais perto daquele em que nos vão fugir, ser tão firme nos valores que lhes passámos e, no entanto, não ter a certeza nunca de que foram suficientes, ver algumas mágoas do que não conseguimos evitar e reconhecer que estas serão as primeiras que os farão mais fortes pela vida fora....

Também não me sinto preparada, até porque só tenho uma e, mesmo com a maioridade quase a bater-lhe à porta, sinto que ainda tenho tanto para lhe transmitir, tanto para lhe ensinar, tanto para a proteger!

Falamos muito. Aliás, ambas falamos pelos cotovelos e, todos os dias, sou também surpreendida pelos comentários, pelos raciocínios, tão infantis uns, ainda, tão maduros e até profundos, outros.

Bem...posso-lhe dizer a única coisa que me satisfaz: Contra tudo e contra todos, contra o tempo, contra a distância, contra todas as voltas da vida, ela é e será sempre minha filha, uma parte de mim e das minhas entranhas, que nada conseguirá separar!

Nota: Pronto, tá bem...se querem saber, a rapariga também gosta de touradas!!

Patti disse...

Vizinhança:
'Tou cheia de pressa, mas já vi que muitos pais me entenderam. Não sou só eu com esta ideia de vôos de filhos com asas maiores que as nossas. Bjs

LeniB disse...

Ó Patti....o salvoconduto não disse que ía ver "a outra"!!!!
Vais ao Norte, é?? hummmmmmmmm

Unknown disse...

Ver um filho ‘voar’ de casa para um poiso só dele já deve ser chato, ver o poiso do filho a milhares de quilómetros ainda deve ser pior, mas eu sinceramente já equaciono fomentar o voo dos meus para locais além fronteiras. Gosto demais dos meus filhos para os ver a marcar passo neste país de ‘inhos’.

Se calhar ainda vou pagar por esta visão europeísta, mas actualmente não consigo ver as coisas de outra forma, depois do que trabalhei, construi e colaborei com este país, e o retorno que tive dele.

:|

bjocas

carlota disse...

A natureza é sábia nisto dos filhos.
Por exemplo um pássaro, choca os ovos e depois de nascidos os filhotes alimentas-os deseperadamente com um instinto protector desmedido, mas tambem é essa mãe pássaro que os tira para fora do ninho e muitas vezes empurra-os para o 1º vôo.
Nós educamos os nossos filhos e tentamos passar-lhes os nossos valores e aquilo que desejamos para eles.
Eles crescem e fazem as suas opções.
Nós apenas passamos a ser uma base onde eles sabem que podem aterrar em segurança e daqui partir para novos vôos.
Quanto ás Touradas sou suspeita para falar porque adoro...e desde muito pequenina que gosto, no entanto isso não diminui o meu amor pelos animais.

PDuarte disse...

caramba, tinha logo que escolher o blogue que escolhi para blogue do mês.
ou temos algo em comum ou vou jogar no euromolhões.

ana v. disse...

Patti, percebo muito bem essa duplicidade. Se quiser, escrevi sobre isso também no Porta do Vento. Espero que ajude...
Está aqui o link: http://portadovento.blogs.sapo.pt/110347.html

beijinho

Patti disse...

Ana:
Bem vinda ao Ares. Estive a ler o seu post e é isso mesmo que relata, de uma forma clara, corajosa e emotiva.
Volte sempre.

f@ disse...

Post sensível e bonito... tb gosto dos animais todos ... mas moscas nem me fales... não posso com moscas... detesto... ando sempre a suplicar que me fechem as portas... que entre de "rabo" pequeno e rápido... porque até para as matar me dá nojo...
coincidência que o meu filho tb gosta mto de tourada.. coisa que eu tb não sei explicar.. parece-me que tem algo de espectacular nos passo dos animais tipo bailado... ...mas eu não sei ver assim...
A compreensão e a tolerância fazem milagres...

em azul disse...

Gostei muito de ler, Patti
Este post fala de ternura.

Beijo

Su. disse...

Que te posso dizer para não desatar num arraial de palavras a dizer mal das touradas e das caçadas que foram assuntos mais que discutidos com o meu pai, amante tb dos animais, enfim… SIM, deixemo-los voar, estamos aqui para isso, para lhes ensinar a voar segundo as melhores técnicas n para controlar o voo, e lá sabem eles que só quem tem a sorte de ter um bom mestre de voo chega mais alto… beijos.